segunda-feira, junho 23

Bem-vindos à selva!

Provavelmente, à hora que escrevemos sobre o Estados Unidos-Portugal, já perdemos o timing de fazer o trocadilho entre humidade e... humildade. E se alguém da imprensa especializada o fez, congratulamo-lo por isso, servindo estas linhas, nesse caso, para se reforçar uma posição sobre a (falta) de humildade da equipa das quinas neste Brasil'14. Porém, não nos debruçaremos sobre os penteados, as botas, os gestos ou, até, sobre a vida pessoal dos atletas, pois a real falta de humildade que pretendemos lembrar está bem patente quando, após uma derrota por... 4-0, um jogador diz na antevisão de um jogo decisivo que "Portugal não tem de mudar nada". Assim, ouvindo ou lendo Raúl Mereiles, ficou bem claro que a Selecção de todos nós só por milagre sairia viva da selva do Arena Amazónia. É que apoiar-se nos feitos do Euro'2012, numa qualificação conseguida em cima do joelho e esperar que um Mundial corra bem 'só porque sim', é não saber com que linhas se cose o desporto-rei.

De facto, o Portugal do 'Mundial Brazuca' viveu sempre numa realidade paralela e nunca se dignou sequer a pôr a hipótese de que a mesma pudesse ser ficção. Com o 3.º lugar do Euro'2012 no bolso, não se precisaria mudar nada. Nem jogadores, nem sistemas, nem plano. A boa forma haveria de aparecer e com ela as rotinas de uma equipa que, lentamente, até foi perdendo a coisa que tinha de melhor. Falamos, claro, da capacidade de controlar o jogo aquando de um resultado adverso. E essa valia sempre foi negligenciada por um Paulo Bento que a ganhar encolhia-se e que só a perder dava ordem para a equipa jogar como o povo português gosta: agressivos com bola, circulação rápida, procura pela área e pressão na perda da bola. Até isso se esfumou. Até isso se perdeu numa selva onde se pensou que para se controlarem os EUA um golo caído do céu (Nani 5') bastava. Com isso em mente, Portugal 'aplicou' depois um ritmo digno de jogo de Velhas Glórias (e tão bem que lhe fica o termo), ignorando jacarés, serpentes e piranhas.

E nem enquanto os Estados Unidos aproveitavam a confusão defensiva portuguesa (Ronaldo não tem que obrigatoriamente baixar, mas Almeida não podia ficar com dois adversários) Paulo Bento se lembrou de que a equipa teria que ter capacidade para suster o adversário, procurar o segundo-golo (que até ia aparecendo num lance isolado - Nani ao poste) e 'matar o jogo'. Não. Bento limitou-se a corrigir o momento defensivo (linha de quatro no 'miolo' para defender e deixar Ronaldo e Éder para a transição) e isso bastou-lhe. Algo que foi sublinhado à entrada para a segunda metade com a substituição de Almeida por William Carvalho (que desviou Veloso para a lateral-esquerda). A ordem era defender e, até, não tem que haver espanto pois sempre assim foi com o ex-treinador leonino. Sendo que o que acontece a seguir também não é caso para surpreender ninguém: em dois lances os Estados Unidos dão a volta ao jogo, colocando todas as fragilidades defensivas de Portugal à vista do Mundo.

Realmente não tem que deixar ninguém desconcertado que a chuva molhe quem não se protege, mas, no entanto, que Portugal não saiba já reagir, forçar e, pelo menos, tentar reclamar o que é seu, é que tem de espantar. É que se no Euro que criou toda esta ilusão Portugal soube responder e com isso justificar a titularidade de um 'onze' congelado para este Mundial, restavam-nos ao menos as fortes reacções e as vitórias morais que as mesmas nos davam. Mesmo não chegando para nada (como sempre) Portugal podia ao menos manter a sua arrogante sobranceria que culpa tudo o que é externo, esquecendo-se dos defeitos próprios. Mas hoje nem isso. Não houve forcing, não houve pressão, não houve inteligência, nem individualidade (quanto mais colectivo), houve sim um 'late night goal' de Varela (90'+5) que deixa Portugal ferido e moribundo no chão do pantanal, a sofrer por um milagre. Uma prenda divina que a chegar fará esquecer que a culpa própria existe. E o que se aprenderá aí?

EUA-Portugal, 2-2 (Jones 64' e Dempsey 81'; Nani 5' e Varela 90'+5)

2 comentários:

Tasqueiro Ultra-Copos disse...

Sinceramente já estou um bocadinho farto de ver esta selecção a fazer contas e sempre atrás do prejuízo. Mesmo na melhor campanha de sempre, talvez, euro 2004, foi da maneira que se viu...

Marco Morais disse...

Não te fartes tão rápido, Tasqueiro. =)